” PRIMEIRO PASSO “
Por B.L, Manhattam, N.Y.(Publicado na Revista Grapevine)
“Admitimos que éramos impotentes perante o álcool; que tínhamos perdido o domínio de nossas vidas”.
Antes de meu ingresso em A.A, eu tinha dado o Primeiro Passo lentamente através de um período de vários anos. Não foram as pessoas de A.A. as que me ajudaram nisto; foram todos aqueles não-alcoólicos que nunca compreenderam nem souberam tratar a mim e a minha enfermidade. Hoje, fazendo um retrospecto, estou agradecido pela sua rudeza, porque me forçaram a conhecer A.A, já lá se vai vinte e cinco anos.
Esse vacilante passo inicial que dei para a recuperação em A.A. não se encontrava anotado realmente na Primeira das Doze pegadas que os membros pioneiros de A.A. haviam deixado para guiar-nos. Porém, antes de minha chegada a A.A., eu havia começado a dar-me conta de que minha maneira de beber estava me ocasionando problemas. Isto, certamente, era difícil de crer; conhecia muita gente bebedora que não se metia em problemas. É verdade que minha vida era desastrosa seqüência de dificuldades, mas argumentava comigo mesmo que a causa de tudo aquilo não podia ser a bebida. O destino, simplesmente, me havia tratado mal e por isto havia deteriorado minha família, minha vida amorosa, meu trabalho e as relações com meus chefes, minhas angústias econômicas, meus amigos, minha insônia, meu nervosismo.
Não obstante, continuava buscando desesperadamente provar que a bebida não era um problema para mim. Se eu era um fracasso com a bebida e não um êxito, não era por falta de intentos! Olhando para trás não se fazia tão difícil entender porque eu não podia (como outros não têm podido) aceitar minha incapacidade para beber, para a qual (a incapacidade) a adicção farmacológica é uma explicação simples. As recompensas, prazeres e gratificações da bebida eram tão extraordinárias! Beber era muito fácil. Sua ação era quase instantânea, anestesiando como por arte de magia, qualquer sensação de descontentamento. Era aceito socialmente. Toda minha vida social, todas as atividades que eu considerava divertidas, estavam acompanhadas invariavelmente pelo álcool.
A idéia de não beber era aterradora por ser desconhecida. Imaginava-me numa existência desprovida de graça, alegria e encanto. Deixar de beber significaria ter que me converter em um desses tipos rígidos, intolerantes e puritanos.
Para mim é muito importante recordar agora que toda minha vida estava comprometida, não somente os benefícios aparentes do álcool. O mentir aos outros e o permanecer submerso na autocomiseração eram hábitos que não me produziam temor porque os conhecia muitíssimo bem. Com eles me sentia mais cômodo e, em certos aspectos, até os considerava divertidos. Ademais, tinha permanentemente uma desculpa maravilhosa para justificar-me por meus feitos insanos: “Estava bêbado”.
Deixar de beber, então, parecia-me uma proposição desagradável e insuportável. E, além de tudo, talvez não fosse necessário fazê-lo, se conseguisse que as pessoas mudassem sua atitude para comigo, verdade?
Mas não. As pessoas não mudavam e, antes pelo contrário, pioravam. Minha família, em seu descontentamento, enfatizou que a fonte de todos os meus males era a bebida. Os amigos que expressaram preocupação e os chefes que me despediram ajudaram a conformar esta verdade. Pessoas desconhecidas e donos de bares que procuravam ajudar-me, diziam: “Você não deveria beber”. Um policial que me prendeu por desordem e embriaguez, um médico que me repreendeu pela minha maneira exagerada de beber, um dono de mercearia que me cobrou o que eu lhe devia, um operário que me retirou aos empurrões de uma taberna, todos eles ajudaram no ensino da lição.
Os reiterados fracassos em meu esforço solitário para “fazê-lo melhor”, foram criando um desespero interior que acabou por, finalmente, quebrantar meu falso raciocínio e meu orgulho. Alçado à borda da loucura, encontrei um artigo jornalístico sobre A.A.
Assim, ao primeiro dia em que telefonei para A.A., minha luta já não era tão intensa contra a enorme evidência de que o álcool era a causa do caos em que minha vida se encontrava. Eu havia admitido também, muito a contragosto, que não podia manejar a bebida.
É claro que minhas conclusões não eram necessariamente equivalentes a um diagnóstico científico do alcoolismo. Quaisquer médicos, conselheiros ou profissionais desta área que conheça a lista de sintomas do alcoolismo, elaborada pelo Dr. Jellinek, pode determinar corretamente se um determinado bebedor apresenta ou não os sintomas. Mas um diagnóstico efetuado por outra pessoa não constitui um passo para a recuperação do bebedor, a menos que ele mesmo dê o Primeiro Passo de A.A. Eu o dei cegamente ao início, e embora não o tenha feito da melhor forma, qualquer modo de começar é melhor do que nenhum. Nos anos subseqüentes dentro de A.A. encontrei através de meu esforço consciente e sistemático o caminho para entender e praticar todos os Passos, e eles reiteradamente adquirem em mim valores novos e surpreendentes.
Para mim, a parte mais árdua do Primeiro Passo está na implicação do fato de que minha vida havia se tornado ingovernável. Tendo os efeitos de minha vida alcoólica apenas superados, pude ver mais claramente que nunca o grau de desordem em que me encontrava, o prolixo trabalho de recuperação que me esperava, e compreendi que para permanecer sóbrio, teria que investir numa gigantesca tarefa de reabilitação pessoal em muitos aspectos que, pelo menos aparentemente, não estavam ligados ao álcool.
Em síntese, o praticar apenas um passo desde o tenebroso abismo do alcoolismo até a claridade da vida sóbria não me levaria muito longe. Seria suficiente para mim o vaguear por perigosos caminhos estreitos e atalhos, em vez de transitar pela ampla avenida do programa de A.A? Ou deveria escolher o caminho traçado pelas pegadas de todos os A.As. que me haviam precedido? A escolha era exclusivamente minha. Poderia seguir qualquer caminho, mas era necessário que me orientasse pelo caminho exato se, de fato, desejava chegar ao lugar onde se encontravam meus companheiros de AA. Posto que já havia praticado o Primeiro Passo, podia perfeitamente estacionar ali. Podia simplesmente deixar de beber, e ponto final. Podia contentar-me em apenas sobreviver, e aquietar-me como uma uva seca pelo resto de minha vida.
Transitar pelo caminho do programa pareceu-me muito difícil, até que alguém me disse:
“Caminha passo a passo”. De sorte que tomei a rota marcada pelas pegadas da esperança, a resolução e a ação. As pessoas que encontrava em minha volta eram sóbrias e alegres por estarem trilhando este mesmo caminho. Escutando atentamente suas histórias, ouvi algumas mais horripilantes que a minha; outras não eram tanto. Se me tornou evidente que todos aqueles alcoólicos haviam sentido em alguma oportunidade a mesma desesperança, os mesmos medos, dores e angústias que eu havia experimentado.
Também era óbvio que as pessoas com problemas alcoólicos similares aos meus, puderam sobrepor-se a eles e, ainda que parecesse inacreditável, rirem-se deles. Por outro lado, era evidente que aquelas pessoas tinham muito mais conhecimento acerca do alcoolismo do que eu. Eles sabiam que se tratava de uma enfermidade que podia enganar suas vítimas, e que o maior perigo residia no primeiro gole.
Eles tinham alguma informação, ou magia, ou segredo, ou poder dos quais eu carecia, mas que se os utilizasse poderia seguir adiante. Tinha que crer naquilo que via: que algum poder mais sábio, mais forte e maior que o meu poderia devolver-me à sanidade. Logo cheguei a uma decisão que sequer notei quando ocorreu: Tratar de praticar esse plano de A.A., ainda que em princípio não o compreendesse. Alguém disse que nesta atitude mostrava-se a ação de Deus. Como vi que outros incrédulos como eu também estavam se beneficiando, disse para mim mesmo que não perderia nada se tentasse.
Havendo começado com o Primeiro Passo, tenho dito que os demais Passos além de corretos são altamente benévolos. E ainda não conheço outras sugestões que sejam mais efetivas como programa de recuperação.
B.L., Manhattan, N.Y Tradução: Edson H. Colaboração, blog do Grupo Rosa Mística de AA
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